Religião e cultura

Foto: Rogério Soares, Catedral Nossa Senhora Santana, Caetité, 2016. 
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Em A Civilização do Espetáculo, o escritor peruano Mario Vargas Llosa responsabiliza as religiões, especialmente a Cristã no Ocidente, pelo desenvolvimento das artes (música, pintura, escultura, arquitetura etc.). O alijamento das religiões, provocaria para o escritor, o engessamento das culturas tais como a conhecemos hoje e infertilizaria a vida a níveis inaceitáveis. Seria, portanto, deletério para as culturas, o fim das religiões. Pois em torno delas, seja para exaltá-las ou para criticá-las, viceja um campo muito propício à criação de expressões artísticas, que não são outros senão, formas dos homens externarem os desassossegos de uma mente deslumbrada com os mistérios do mundo.

Na biografia dedicada ao poeta Cruz e Souza, Paulo Leminski, recorda um pormenor de ter lido “no jornal, uma entrevista recente com o maior teatrólogo da Nigéria, um intelectual de esquerda” que nos faz pensar em termos mais claros sobre o papel das religiões na manutenção da vida e das artes: Lembrando as contribuições da Europa aos países da África o teatrólogo diz:  

“Os brancos nos trouxeram coisas de valor. Como o seu pensamento científico e filosófico, incluindo o marxismo. Mas o preço que temos que pagar é alto demais. O ateísmo é a morte dos deuses. Com a morte dos deuses, vem a morte das danças, que são para os deuses. Com a morte da dança, vem a morte da música, que acompanha as danças. Ao adotarmos filosofia ateia, estaremos matando toda a árvore da nossa cultura. Um marxismo, para nós, não pode nem deve negar nossas crenças. Porque estaria negando a nós mesmos.”

Como vemos, não era tolerável, mesmo para um intelectual de esquerda o fim das religiões, sobre pena de que esta precipitasse o fim das culturas. Abandonei a fé nas religiões quando ainda era um adolescente. O ateísmo que pratico desde então não me permite acreditar numa entidade que com força desconhecida governa o desgoverno do mundo. Sei, porém, reconhecer que, são as religiões, criadas a partir da perplexidade do homem sobre a sua condição, as grandes responsáveis por encorajarem e propiciarem, denodados artistas, caminhos para externarem as suas muitas inquietações sobre as faltas de sentido para a existência.  

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